domingo, 12 de setembro de 2010

Abusos Praticados Por Agentes da Autoridade do Estado

Abusos Praticados Por Agentes da Autoridade do Estado

Cabe ao policial Militar, como agente da Administração Pública e responsável pela polícia preventiva e repressiva, zelar pela ordem e sossego públicos, bem como pela incolumidade física dos cidadãos. No exercício de suas funções são concedidas algumas franquias aos referidos policiais, tais como o uso de armas de fogo, algemas e outros apetrechos sem os quais não poderiam cumprir eficientemente com o trabalho ao qual seja, o de reprimir a criminalidade. Entretanto, por não possuir salvo-conduto que lhe permita tudo, nem tampouco lhe seja concedido direito à indenidade. O exercício regular desse direito não passa pelo abuso, nem se inspira no excesso ou desvio do poder conferido. Visando expor a questão relativa ao abuso RENÉ DE PAGE em sua obra Traité élémentaire..., vol. I, Páginas 111/112, inicia assentando que o exercício dos direitos é condicionado a certas regras fundamentais de polícia jurídica. Sem dúvida que todo direito, enseja uma faculdade ou prerrogativa ao seu titular, mas ao mesmo tempo reconhece que tal prerrogativa deve ser exercida na conformidade do objetivo que a lei teve em vista ao concedê-la ao indivíduo. Essa questão relativa ao limite do exercício do direito, além do qual poderá ser abusivo, quer dizer, a linha divisória entre o poder concedido e o poder excedido, constitui a essência da teoria do abuso de direito.

Assim, se um policial, quando em serviço, usando uniforme e equipamentos da corporação se excede nas funções que lhe foram atribuídas e faz uso dela, responde o Estado pelos prejuízos que deste ato advenham. Aplica-se, na hipótese, a regra geral contida no art. 37, § 6º, da Constituição Federal. A responsabilidade é objetiva, posto que as pessoas jurídicas ali definidas respondem pelos atos de seus prepostos. Se o ato foi abusivo ou praticado com excesso de poder, identifica-se aí a culpabilidade do agente público e, então, haverá em favor do Estado o direito de regresso. Nem cabe alegar que o fato do preposto ter cometido ato ilícito e caracterizado, ad exemplum, como conduta criminalmente tipificada, constitui causa excludente da responsabilidade estatal. O abuso mais confirma sua obrigação de responder, posto que é sua responsabilidade exclusiva a arregimentação de pessoas para o efeito policial. O policial não é um servidor qualquer. Dele se exige atributos especiais. Há de ser destemido, sem desbordar; há de mostrar-se intimorato e forte apenas no combate ao crime e atos criminosos. Não basta que seja honesto e escorreito. Há, ademais, de "parecer" honesto.

Diariamente, por meio da imprensa escrita, falada e de telejornais, tomamos conhecimento de policiais que no exercício regular de suas funções causam danos a terceiros, às vezes irreversíveis. Estes nefastos acontecimentos de pessoas que sofrem constrangimentos causados por policiais despreparados e inconseqüentes, vêm se tornando corriqueiros. Poderia ser lembrado nos dias atuais que são comuns os confrontos entre policiais e marginais nas favelas, em vias públicas ou interior de estabelecimentos e residências. Nesses casos, embora os policiais possam ter agido com moderação e comedimento, procedido segundo as normas de conduta estabelecidas para as circunstâncias do momento, responderá o Estado, objetivamente, pelos danos que essa ação legítima causar a terceiros. São acontecimentos não desejados e fruto muito mais do recrudescimento da violência dos criminosos que do comportamento dos agentes policiais, mas que impõe uma resposta mais severa destes. O chamado "poder paralelo" do crime organizado não pode servir de excludente ou subterfúgio dos agentes policiais, não podendo se abstrair do exercício do respeito que merecem todos os cidadãos. Nem por isso, entretanto, ficará o Estado acobertado pela indenidade civil, pois vige – como regra constitucional – a teoria do risco administrativo, que obriga o Estado a indenizar, sem indagação de culpa, em seu sentido amplo. Praticado ato abusivo ou com excesso de autoridade que cause dano ao patrimônio material ou subjetivo do cidadão, ao Estado caberá compor os danos, com direito de regresso contra seu servidor. Portanto, de qualquer modo que se manifeste o abuso de autoridade, caberá à Administração responder pelas conseqüências danosas que dele resultar.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Assédio Moral nos Batalhões da PM

“ASSÉDIO MORAL NOS BATALHÕES DE POLÍCIA MILITAR”


Conceito de Assédio Moral

É toda e qualquer expressão (atitude) de superior hierárquico, contra subordinado, que venha a ferir sua integridade moral. Assim, entendo que é uma atitude de depreciação ou humilhação que parte de um superior para um subordinado. (conceito nosso).


Como Acontece?

É bastante comum nos ambientes militares a ocorrência de atos emanados de superiores contra subordinados que desrespeitem e firam a integridade moral, pois o militarismo não só está em desacordo com as normas constitucionais, como está necessitando de novos horizontes, para que possamos mudar esse quadro. O que realmente ocorre é que por se acharem que são superiores aos demais servidores que lhes acompanham na dura carreira militar, alguns atos emanados desses “superiores” são desenvolvidos de forma exagerada, tais como: gritos de superiores contra subordinados, designações e atribuições que não condizem com seus atributos, bem como algumas taxações indignantes para com subordinados.


O que a Lei diz a Respeito?

Podemos citar a Lei Estadual nº 3921, de 23 de agosto de 2002 do Estado do Rio de Janeiro que veda o assédio moral no trabalho, no âmbito dos órgãos, repartições ou entidades da administração centralizada, autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, do poder legislativo, executivo ou judiciário do Estado do Rio de Janeiro, inclusive concessionárias e permissionárias de serviços estaduais de utilidade ou interesse público, e dá outras providências. (ver lei na net).

A Constituição Federal de 1988, consagra em seu Art. 5º o seguinte:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
...
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
...
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;


O Que Fazer Para Mudar o Quadro?

O Estado do Rio de Janeiro já deu o primeiro passo na caminhada por um estado mais digno de trabalho em sua esfera estadual de trabalho, cabe aos demais estados da nossa nação, seguir os passos do Rio e editar uma Lei que venha proporcionar melhor qualidade de trabalho para seus servidores, o que deve ser feito o mais rápido possível, e deve ser cobrado de forma veemente, principalmente dentro dos Batalhões e Companhias de Polícia Militar.


Francisco Alderi da Silva
Soldado PM/RN e Acadêmico de Direito do 10º Período

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

O “BICO” DOS POLICIAIS MILITARES: VÍNCULO EMPREGATÍCIO OU ILÍCITO ADMINISTRATIVO?

O Texto a seguir é de autoria do Dr. Pedro Durão, Procurador do estado de Sergipe.

O artigo proposto tenta elucidar dúvidas colocadas no cotidiano diante das atividades exercidas pelos Policiais Militares dos Estados-membros em atividades fora do exercício de suas funções públicas.
A realidade dos fatos é cada vez mais visível. A insatisfação dos militares estaduais surge com a freqüência exacerbada aos serviços diários extra-funcionais, patrocinando, portanto, a busca da elevação dos parcos salários que percebem.
A crise se instalou. É de notar a repercussão das “greves” das Polícias Militares que tem invocado a sensibilidade dos governadores e da sociedade em geral, sempre com a mesma bandeira: remunerações achatadas.
Diante desses atos, demonstraram o desagrado e a procura da melhoria dos valores percebidos pelos serviços prestados ao Estado.
Na realidade, observamos exercerem suas atividades como seguranças particulares não habilitados nos supermercados, lojas, residências, clubes, boates, condomínios ou em outras tarefas para entidades privadas.
Uma interessante matéria publicada na mídia local inquina a realidade que passamos:
“Seis anos depois da polêmica que acabou por derrubar a autorização para policiais fazerem bico, o secretário de Segurança Pública, Josias Quintal, anunciou ontem que voltará a liberar o segundo emprego para policiais civis, militares e bombeiros. Eles deverão estar uniformizados e ter autorização dos batalhões. O secretário pediu um estudo jurídico sobre o caso, depois de uma reportagem do GLOBO, no último Domingo, mostrar que policiais da ativa lotearam as ruas da cidade, cobrando de R$ 5 a R$ 360 por mês de moradores e comerciantes para fazer segurança clandestina. Josias explicou que se decidiu pela legalização porque “não adianta ser hipócrita”, já que a população, em sua opinião, aprova o serviço e está disposta a pagar por ele. Com o anúncio, o secretário despertou o debate.
— Se tirarmos a segurança das ruas, a população ainda vai ficar com raiva de nós. Temos que regularizar a situação. O policial que dá o seu suor em defesa da população, com honestidade, tem o meu apoio, mas sou contra a terceirização do serviço de segurança privada com mão-de-obra desqualificada — disse Josias.
Ele afirmou abominar os agenciadores — policiais que dominam o ponto e contratam pessoas sem especialização pagando baixos salários:
— Não admito que o policial faça da segurança um negócio. Esses policiais serão punidos.
O secretário determinou que a faxina começasse dentro da própria secretaria. O sargento Antônio Carlos de Oliveira, lotado na Coordenadoria de Gerenciamento de Contingência, que explora o serviço de segurança clandestina na Rua Belfort Roxo e em parte das ruas Barata Ribeiro e Ministro Viveiros de Castro, em Copacabana, já está sendo investigado. Josias determinou que a PM tomasse as providências para puni-lo.
A bandeira do bico legal, levantada por Josias, coincide com a vontade do deputado Carlos Minc (PT) de voltar a discutir o assunto e até propor o encaminhamento de um novo projeto de lei. Minc derrubou a Lei do Bico, aprovada em 1994 pelo então governador Nilo Batista, porque, de acordo com ele, ela não agradava aos policiais, que só podiam ter um segundo emprego na área de segurança e se fosse autorizado pelo comandante do batalhão (no caso dos PMs).
— Como muitos comandantes eram donos de empresas de segurança, os PMs se viam obrigados a trabalhar para eles. Mas sou favorável à regularização para o policial não ser duplamente punido pelo arrocho salarial e pela clandestinidade. Lamentavelmente, hoje, ele é sub-remunerado e pouco qualificado — disse Minc, que vai marcar uma audiência pública na Assembléia Legislativa e convocar autoridades do governo e policiais. “
Ao lado de tantas outras contradições fáticas, indagações surgem dos fatos delineados sob o ponto de vista jurídico: O PM concursado que está no cargo público pode exercer uma tarefa paralela? Os outros tipos de serviços amplamente realizados no seu horário de folga e com aceitabilidade dos seus superiores hierárquicos constituiria um ilícito administrativo passível de punição disciplinar no seio da Corporação?
Ainda, continuamos a indagar: Será que estas atividades particulares, fora dos quadros estabelecidos para cada agente público é legal? Os créditos trabalhistas advindos desta relação com entidades particulares estariam amparados pelo direito do trabalho? Vejam que as indagações surgem à medida que percorremos os caminhos deste pequeno estudo.
Não se pode deixar de firmar que a realidade brasileira tem demonstrado a dificuldade na remuneração dos agentes públicos comparada com outros países que valorizam o setor terciário. O desprazimento destes propostos da segurança pública dos Estados tem provocado, há algum tempo, a busca incessante ao chamado “bico”.


O “BICO” E A SUA ADMISSÃO PELOS PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO DO TRABALHO.

O Bico, na verdade, trata-se da expressão coloquial utilizada para registrar ou denominar a atividade extra-funcional admitida no meio policial militar como emprego subsidiário.
As premissas iniciais da doutrina consignam a submissão aos princípios gerais do direito trabalhista que caracterizam sua autonomia. Não há dúvida de que as incessantes transformações sociais afetem os princípios do Direito do Trabalho.
Márcio Túlio Viana refletindo sobre a flexibilidade e o que se passa no plano da lei, em monografia premiada, aduz: “É que a norma trabalhista não busca apenas regular as relações trabalhistas entre dois contratantes (para isso seria bastante o direito comum), mas proteger um deles, em face do outro. Se a tutela se vai, nada lhe sobra de especial.”
Repensando o novo Direito do Trabalho, Tarso Genro afirma: “...Por isso é preciso pensar num Direito do Trabalho, não só voltado para interferir na questão da socialização do emprego e das atividades, como também na precariedade, na meia-jornada, na intermediação e na intermitência.”
Aliás, os princípios do Direito Laboral são verdades de um sistema de conhecimento admitidas para sua operacionalização. Se vê, de logo, a configuração dos princípios da proteção, da primazia da realidade, irrenunciabilidade, da razoabilidade, da boa fé e, finalmente, do dúbio pro misero, ainda, permanecendo a enquadrar e tutelar a situação em estudo.
Em verdade, analisando o cerne da questão, há um conflito entre os princípios do direito laboral e outros do direito administrativo, como por exemplo, a busca do interesse público.

DO LOCUPLETAMENTO ILÍCITO POR PARTE DO EMPREGADOR.

Passo a passo, constatamos que não podemos afastar o vínculo trabalhista daqueles militares estaduais que exercem funções paralelas ao cargo público.
Acentua-se, na verdade, o papel do trabalhador, desprendendo sua energia em prol do empregador privado gerando, portanto, responsabilidades empregatícias sob pena de enriquecimento sem causa do ente privado.
A empresa que admite o Policial Militar, verbalmente ou não em seus quadros, lhe tutela créditos trabalhistas por seu labor, independente de vedação normativa.
A consensualidade brota como aspecto pertinente ao consentimento, dispensando maiores formalidades na constituição do mencionado contrato de trabalho. Até porque o militar estadual nesta relação figura-se como empregado por prestar serviços sob dependência do empregador e diante da subordinação jurídica.

DA CARACTERÍSTICAS DA RELAÇÃO DE EMPREGO.

Sabemos que a relação de emprego é alcançada quando se observa a existência dos requisitos do vínculo empregatício, ou seja, o trabalho subordinado, continuado e assalariado. Fundamenta-se, por efeito, na relação de subordinação e dependência hierárquica do empregado.
Perfazendo esse entendimento, podemos firmar que o operador do direito que se depara com o litígio individual trabalhista ou faz análise da contenda se enquadra nos princípios norteadores da relação empregatícia, aplicando ou não os efeitos oriundos do direito laboral ao reclamante policial militar não é pacífica.
É fácil entender que a relação empregatícia não pode ser influenciada pela legalidade ou não do “bico”. Nesse sentido, como reforço ao argumento, o próprio Tribunal Superior do Trabalho firmou a orientação jurisprudencial nº167, afirmando:


POLICIAL MILITAR. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO COM EMPRESA PRIVADA. Preenchidos os requisitos do art. 3º da CLT, é legítimo o reconhecimento de relação de emprego entre policial militar e empresa privada, independentemente do eventual cabimento de penalidade disciplinar prevista no Estatuto do Policial Militar.

Por outro lado, a atividade paralela reconhecido como o “bico” não tem encontrado guarita em alguns tribunais:
POLICIAL MILITAR. VÍNCULO DE EMPREGO COM EMPRESA PRIVADA. Ausentes os requisitos do art. 2º e 3º da CLT, o serviço de garçom prestado à reclamada, não se amolda à relação de emprego. O policial militar está legalmente impedido de exercer atividade laboral, em face do que dispõe a Constituição Estadual, no seu artigo 46, inciso III. Recurso desprovido. (Ac. 00818.026/96-0 RO - Denis Marcelo de Lima Molarinho - Juiz-Relator. 6ª Turma - Julg.: 26.08.99. Publ. DOE-RS: 13.09.99

POLICIAL MILITAR. VÍNCULO DE EMPREGO COM EMPRESA PRIVADA. Nulo é o contrato realizado por policial militar com empresas comerciais ou industriais, uma vez que ele é impedido por lei de prestar serviços a tais entidades. (TRIBUNAL: 6ª Região. ORIGEM: Procedência : RE05-0001421/96 (5ª JCJ DO RECIFE/PE. DECISÃO: 09 03 1998 TIPO: RO NUM: 8885 ANO: 97. TURMA: 3ª. Relatora NISE PEDROSO).



ILÍCITO ADMINISTRATIVO À LUZ DOS DIPLOMAS CASTRENSES.

Sabe-se que a relação de emprego é alcançada quando se observa a existência dos requisitos do vínculo empregatício, não se excluindo da proteção dispensada aos trabalhadores em geral.
Por outro lado, a atividade paralela desencadeia outros efeitos. Tal como, o ilícito administrativo, no sentido de que o “bico” afronta os ditames castrenses vigentes.
Esse fenômeno sempre existiu, talvez, pela letargia dos seus superiores hierárquicos e do próprio Estado não admitindo medidas contendoras. Tendo, inclusive, alguns superiores utilizado a força pública como suporte para manutenção dos serviços paralelos que lhe confere credibilidade perante a comunidade, diante da facilidade junto aos órgãos de segurança pública.
A crise da categoria e os parcos salários, ou até mesmo o estado de necessidade, como alguns estudiosos tentam sustentar, não afastam a aplicação das sanções administrativas impostas pelos regulamentos disciplinares dos Policiais Militares (RDPM) existentes em cada Estado.
O que está havendo é uma crise institucional nas milícias do Brasil, aguçando a quebra da hierarquia militar e a falta de disciplina, por efeito, comprometendo a ordem pública necessária a sociedade.
Por fim, a violação das obrigações ou dos deveres policiais militares constituirá crime ou transgressão militar, conforme dispuserem as legislações ou regulamentação específica.

CONCLUSÕES.
Finalmente, de tudo que foi cuidadosamente analisado, firmamos as seguintes conclusões a respeito do proposto:
1. O atual direito do trabalho deve tutelar as relações empregatícias, garantindo os créditos trabalhistas oriundos do conhecidos “bicos” praticados pelos Policiais Militares.
2. O empregador privado que acolhe labor alheio não pode deixar de ser responsabilizado pelos créditos trabalhistas pertinentes ao trabalho realizado, uma vez que incorria em locupletamento ilícito, pois é impossível a reposição da força de trabalho.
3. O direito tutelar de cunho público deve galgar espaços para amparar novas relações laborais, adaptando os tradicionais princípios.
4. As Polícias Militares devem prover meios para apurar os atos ilícitos praticados pelos militares estaduais nos chamados “bicos”, com vistas a aplicação das sanções pertinentes a espécie, independente da solução dos dissídios trabalhistas.
5. Torna-se recomendável que o julgador trabalhista, concluindo pelo vínculo de emprego desta natureza, contribua para pacificação dos conflitos doutrinários, dando ciência da transgressão disciplinar ao Ministério Público e ao Administrador público, em busca do interesse coletivo.
6. Os problemas de infra-estrutura e parcos salários desencadeiam a crise institucional nas Milícias brasileiras que devem ser alvo de reflexão pelas autoridades públicas para acarretar urgente e profundas mudanças na atual legislação, com intuíto de coibir conflitos de princípios do direito trabalho e do direito administrativo.

Da perspectiva abordada podemos ver que o assunto não se esgota nesta simples pesquisa.
Em últimas palavras, toda perquirição empreendida parece revelar a necessidade de se robustecer uma formação consciente do aprendizado do direito coevo e das mutações no direito laboral, sempre com o escopo de engrandecimento geral das relações e das adaptações às novas realidades.

BIBLIOGRAFIA:
GENRO, Tarso. Mudanças do direito do trabalho: transição e futuro.
GOMES, Orlando; GOTTSHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1975, p. 201-213.
GONÇALVES, Nair Lemos (org.). Curso de direito do trabalho: homenagem a Evaristo de Moraes Filho. São Paulo: Ltr, 1983.
MAGANO, Octavio Bueno. Manual de direito do trabalho: direito individual do trabalho. 2. ed. V. II. São Paulo: Ltr, 1980.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1984.
VIANA, Márcio Túlio. A proteção social do trabalhador no mundo globalizado – direito do trabalhador no limiar do século XXI. Revista V. 63, nº7. São Paulo: LTr. 63-07

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

A LIBERDADE DE EXPRESSÃO E COMUNICAÇÃO NA INTERNET

Hugo Cesar Hoeschl

1. Disposições gerais

A liberdade genérica de comunicação e expressão é tema pacificamente consagrado pelo direito, nos mais elevados círculos internacionais.

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em seu artigo 11, já dispunha pela sua garantia:

"Art. 11. A livre comunicação das idéias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem; todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na lei".

Da mesma forma, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo XIX:

"Artigo XIX

Todo homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras." (destacado do original).

A tentativa de cercear a expressão alheia, e sua comunicação, nos traz a lembrança dos senhores feudais ingleses, no século XIII, que puniam trovadores e inventadores de contos quando estes lhes provocavam.

A mais desagradável das lembranças é a de Galileu, que envelheceu na prisão da inquisição por "haver pensado em astronomia diversamente de quanto o teriam os censores franciscanos e dominicanos", divulgando suas conclusões. Dentre os sobreviventes, o caso de Galileu é um dos mais infelizes registros de cerceamento à liberdade de expressão e comunicação da história da humanidade.

No Brasil, essa garantia é vigente desde a primeira Constituição, e está atualmente consagrada pela Magna Carta, especificamente nos seguintes dispositivos:

"Art. 5º. ..........

..........

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

..........

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

..........

XIV - é assegurado a todos o acesso à informação....;

..........

"Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1. Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5., IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2. É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística." (destacado do original).

Da mesma forma ocorre no plano legal, através da Lei 5.250/67, a qual, nesses aspectos, foi recepcionada pelo texto constitucional.

Dispõe seu artigo 1º.:

"Art. 1º. É livre a manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de Informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer."(destacado do original).

Como se pode perceber, estamos diante de um instituto que alude à expressão, à comunicação, à manifestação do pensamento, à sua difusão, à criação e mesmo à informação.

2. Liberdade de expressão e comunicação

O Professor José Afonso da SILVA usa a expressão "liberdade de comunicação", no sentido mais amplo, que abrangeria as demais:

"Nesse sentido, a liberdade de informação compreende a procura, o acesso, o recebimento e a difusão de informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada qual pelos abusos que cometer".

Trata-se, acima de qualquer modelagem, de livre divulgação de idéias, de qualquer forma:

"A liberdade de comunicação consiste num conjunto de direitos, formas, processos e veículos, que possibilitam a coordenação desembaraçada da criação, expressão e difusão do pensamento e da informação".

É uma verdadeira expressão da liberdade humana, como um todo, apontada por FERREIRA:

"1. O direito de manifestação do pensamento. A liberdade humana não se concretizaria na prática se não fosse dado ao homem o direito de liberdade de expressão. Esta liberdade abrange os direitos de manifestação da opinião, de discurso e de imprensa".

O Professor CRETELLA JÚNIOR chega a descrever a comunicação como uma necessidade:

"A necessidade da comunicação humana leva o homem a difundir idéias e opiniões, primeiro, de modo direto, mediante a utilização de recursos primários, depois, com o advento gradativo da técnica, por meio de todos os instrumentos adequados à transmissão da mensagem." (destacado do original).

A principal garantia da liberdade de expressão é a liberdade de imprensa, não havendo dúvida de que seu conceito possa ser ampliado:

"O regime de imprensa aplica-se, então a todas as formas de impressão (livros, periódicos, panfletos) e às diversas formas modernas de difusão do pensamento (rádio e televisão), acrescentando-se, sem dúvida, os espetáculos, notadamente o cinema".

Vale dizer: entre as "diversas formas modernas de difusão do pensamento" está, sem sombra de dúvida, inserta a internet.

Assim, a expressão e a comunicação em geral, sob qualquer forma, são mais do que livres no direito brasileiro. Isso significa poder publicar, nos meios de comunicação ou serviços de telecomunicações, qualquer coisa que se queira. No caso dos veículos de comunicação de massa, há cautelas e restrições estabelecidas nas esferas constitucional, legal e regulamentar, principalmente no tocante à proteção da infância e da juventude. Porém elas - as restrições e cautelas - não incidem sobre a internet, o que vale dizer que nela pode ser veiculada qualquer coisa, independente de seu conteúdo, inclusive a tão discutida pornografia.

Essa conclusão é reforçada por três outros referenciais, além dos já apresentados:

1. A internet é um veículo mundial, e nenhuma proibição ou censura tem tal alcançe; 2. Na internet, a informação, as imagens e os sons não vão em busca das pessoas, pelo contrário, estas partem rumo aos dados, ou seja, uma pessoa, na internet, somente vê o que quer ver, o indivíduo tem total controle sobre a escolha dos atrativos e não há a menor possibilidade de alguém ser pego de surpresa por algo que não desejava encontrar, como frequentemente ocorre na televisão; 3. Ao bater às portas da internet e buscar seu ingresso no ciberespaço, as pessoas estão entrando num mundo norteado por outros referenciais, um dos quais é a ética hacker, segundo a qual a informação quer ser livre, como foi visto no capítulo 4.

Isso não significa dizer que as pessoas não são obrigadas a assumir responsabilidades decorrentes da liberdade garantida. Como se vê pelas diversas disposições apontadas, é vedado o anonimato e as pessoas são responsáveis pelos abusos cometidos.

Não é outro o entendimento do Professor José Afonso da SILVA:

"A liberdade de manifestação do pensamento tem seus ônus, tal como o de o manifestante identificar-se, assumir claramente a autoria do produto do pensamento manifestado, para, em sendo o caso, responder por eventuais danos a terceiros. Daí por que a Constituição veda o anonimato".

Entenda-se a expressão responder como estendida às questões criminais, civis e administrativas.

Ou seja, o mecanismo hábil à redução dos abusos, como pornografia infantil, calúnias e facismo, é a responsabilização, e não a censura, como deve acontecer em uma sociedade regida por pessoas amadurecidas.

A fim de evitar abusos e desencadear responsabilizações pessoais no tocante à tudo aquilo que for divulgado na internet, é positivo, por parte dos exibidores, a introdução de um aviso de conteúdo preliminar a quaisquer informações tidas como polêmicas, principalmente no caso da pornografia.

3. A censura moral na internet

Para finalizar, vamos analizar uma última questio: a exposição de material pornográfico na internet materializa imoralidade pública, ofensiva aos bons costumes, e caracteriza o crime descrito pelo artigo 17 da já citada lei 5.250/67 ?

Veja-se o que diz o dispositivo:

"Art. 17. Ofender a moral pública e os bons costumes:

Pena: Detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa de l (um) a 20 (vinte) salários mínimos da região".

Existe uma série de motivos para acreditarmos que não. Mas o mais consistente deles, do ponto de vista legal, é proveniente interpretação do parágrafo único do artigo 12 da mesma lei:

"Art. 12. Aqueles que, através dos meios de informação e divulgação, praticarem abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e informação ficarão sujeitos às penas desta lei e responderão pelos prejuízos que causarem.

Parágrafo único. São meios de Informação e divulgação, para os efeitos deste artigo, os jornais e outras publicações periódicas, os serviços de radiodifusão e os serviços noticiosos".

Por sua vez, o ítem "3. a)" da norma 004/95, aprovada pela portaria 148/95 do Ministério das Comunicações, apresenta uma definição da internet:

"3. DEFINIÇÕES

Para fins desta Norma são adotadas as definições contidas no Regulamento Geral para a execução da Lei n. 4.117, aprovado pelo Decreto n. 52.026, de 20 de maio de 1963, alterado pelo Decreto n. 97.057, de 10 de novembro de 1988, e ainda as seguintes:

a) Internet: nome genérico que designa o conjunto de redes, os meios de transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre computadores, bem como o 'software' e os dados contidos nestes computadores;".

Ou seja, a internet não é definida como uma das figuras descritas pelo parágrafo único do artigo 12 da lei citada, hipótese na qual ela simplesmente não incide, independentemente de a internet ser ou não considerada, no plano metajurídico, como um meio de informação e divulgação.

Mas, deixando de lado o aspecto interpretativo das disposições legais, deve-se levar em conta o fato de que impera na internet a vontade do usuário, ou seja, ele vê o que quer, e só o que quer. Admitir qualquer tipo de restrição numa situação de tão forte presença do livre arbítrio significa retroceder no tempo.

A internet é tão passiva, enquanto repositório de informações, quanto uma banca de revistas ou uma biblioteca pública. Isso precisa ficar claro, e devemos tomar cuidado com as críticas feitas por pessoas que não a conhecem. E foi-se o tempo - esperamos - no qual as pessoas exteriorizavam suas preocupações com as preferências alheias naqueles locais, objetivando restringi-las.

A censura, a qualquer título e de qualquer tipo, é simplesmente incabível na internet. Vamos defini-la:

"Censura é o exame a que determinadas autoridades eclesiásticas ou governamentais submetem os meios de comunicação humana (livros, jornais, filmes, discursos, sermões, cinema, teatro, rádio, televisão), de acordo com padrões discricionários fixados pelo poder censor dentro de determinados limites, estabelecidos na lei".

É uma definição branda, apresentada por CRETELLA JÚNIOR. Talvez o ilustre Professor aceite, em algumas situações, a censura. Discordamos. Censura não é um mero exame, mas o ato de cercear a liberdade alheia de expressão, informação e comunicação, generalizadamente. E não há limites ou padrões a serem seguidos. Ou há o cerceamento, ou não há. E, frise-se, no caso do Brasil, o único padrão fixado, não legal, mas constitucional, é o seguinte: É VEDADA TODA E QUALQUER CENSURA.

O ciberespaço é um mundo onde ela não existe e não é possível, sendo absolutamente irrelevante a natureza da mensagem analisada, da astronomia à pornografia.

A quem discordar do paradigma, seja no plano institucional, empresarial, orgânico ou pessoal, resta uma abrangente, simplificada e fácil opção: ficar fora da internet. Mas censurar, jamais.

A censura é um lixo social mais nocivo do que a própria pornografia, e, se tivermos que fazer uma escolha entre ambas, devemos ficar com a segunda - embora também seja problemática -, pelo simples fato de que a primeira causou prejuízos infinitamente superiores - e irreparáveis - à evolução da raça humana.

Para concluir, enfatizamos que "grandes batalhas têm sido travadas em prol da liberdade de expressão" e que, como afirmou RICHARDSON, " as grandes lutas pela liberdade de expressão têm sido ganhas não nos tribunais, mas nos meetings de protesto, nos editoriais, nas cartas dirigidas ao congresso, na coragem dos cidadãos".

Fonte: unicamp